sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Concurso "Um Conto de natal"2011 - contos vencedores

O Dia de Natal

As ruas são escuras, as sombras escondem-se da própria noite, o medo isola-se nos corações que encontra. Isola-se em mim, porque sou a única que não está feliz. O medo quer companhia para partilhar a escuridão, quer um lugar onde possa ficar. Quanto mais fujo dele, curva após curva, mais forte ele se torna. Quanto mais sozinha na noite, passo após passo, mais forte ele se torna. Quanto mais fria e gelada eu fico, mais forte ele se torna. Resumindo, o medo está então mais forte que nunca.


Sentada no chão húmido de um alpendre, por baixo de uma ténue luz, penso e repenso no sentido que a minha vida está a tomar. Há uns anos, aquilo de não ter nada e não ter ninguém era apenas uma miragem... Só acontecia aos outros e nunca a mim. Mas a verdade é que estou sozinha, fria e com medo... A própria vida escapa-se pelas minhas mãos... Foge de mim como quem foge de um monstro. Quer gritar e deixar-me jazendo naquele chão em que outrora fora a minha casa. Quer renascer.

Levanto-me, deixando aqueles pensamentos vaguearem por outras mentes e não a minha. Observo uma família num pequeno casebre. Uma criança dorme... Enrolada numa fina camada de ternura e calor vinda dos braços de sua mãe. Esta fala animadamente com um senhor de cabelos já grisalhos, diria eu, que é seu pai. Outra senhora coloca uma panela bem grandinha numa mesa recheada de cores. Abre-a e o cheiro de um caldo verde bem quentinho chega até mim. A sala onde se encontravam, tinha apenas um sofá, já velho e com alguns remendos, a mesa da comida, um pequeno candeeiro descaindo do tecto, e um móvel, com quatro pratinhos pequeninos de louça e um copo alto de champanhe, na única prateleira visível. Em cima deste móvel, encontrava-se uma pequena moldura trabalhada em madeira, com uma fotografia das duas senhoras presentes na sala, com chapéus de palha. Eram mãe e filha, numa praia solarenga para os lados de Faro, diria eu. Estava também na sala, uma lareira que irradiava luz e calor para todas as santas alminhas daquele casebre. Aquilo sim... Era uma verdadeira família feliz. Tinham pouco, aliás, muito pouco, mas o importante é que o Natal fortalecia os seus laços e unia esta família de uma forma inquebrável.

E eu, cá de fora, apreciava a felicidade dos outros, com a minha crescendo também, por ver um cenário tão comovente. Tenho pena que o calor não ultrapasse as barreiras das paredes de cimento e venha ter comigo.

Continuei a andar sobre a neve. Aconchegada na escuridão da noite, observava os cenários para lá das paredes e do frio. Casa após casa, a felicidade reinava. Não se via vivalma na estrada branca em que eu passava. Era só eu. Ao rastejar os pés pela neve, sentia cada vez mais o pesar de cada passo tomado e o pesar de cada movimento. Até que uma ténue música, lá ao longe, veio ao encontro dos meus ouvidos. O coro da cidade ia de porta em porta cantando músicas natalícias. Ouvia agora “We Wish You A Merry Christmas”. Cada menino cantava um verso e no refrão, o ritmo e a organização não podia ser melhor. Um dos meninos olhou-me de alto a baixo, com olhos esbugalhados. Colocou um pé na minha direcção e uma senhora aproximou-se, dirigindo-se ao menino com uma voz firme e rígida. Olhou-me repentinamente e com a mão, elaborou um gesto de nojo total. Revirou os olhos e puxou o menino para ela, no momento em que o coro se preparava para partir e começar noutra família a cantoria.

O olhar do menino transmitiu-me calor, mas não o suficiente. Voltei para o meu alpendre e os meus olhos decidiram fechar-se. Para sempre. Era ali, no húmido chão, no dia de Natal, que tudo ia acabar. Há dois mil e onze anos, o Salvador nasceu, no dia 25. Há um segundo, o meu coração parou, no dia 25. Deixou-me. A vida fugira-me definitivamente e a última memória foi o olhar esbugalhado do menino para mim.

Até que a luz me encadeou.

Don Algodon
(Ana Sofia Marques, 9ºB- Escola secundária João de Barros
1ºPrémio- Escalão A)
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Mais um Natal feliz

         A família Gomes era uma família feliz que vivia numa casa pequena, mas confortável. O pai era mecânico e a mãe trabalhava numa fábrica têxtil. Tinham dois filhos que adoravam, o João de 11 anos e a Matilde de 9 anos. Era uma família feliz. Os pais, embora não ganhassem muito, conseguiam sustentar a família, sendo a sua maior preocupação a educação dos filhos.

        Aproximava – se o Natal. Os pais decidiram aproveitar essa data para mostrar aos filhos que para se ser feliz não era importante ter muita coisa. Então informaram os filhos que não iriam receber presentes.

       - Como sabem, é preciso poupar, porque o país está em crise e há muito desemprego. – começou a mãe.

      - Por isso, decidimos que este ano não receberão presentes no Natal. Já têm muitos brinquedos. - acrescentou o pai.

      - Não há problema. Logo que não faltem as rabanadas e o bolo – rei. – respondeu o João. – Não é Matilde?

      -Sim, claro, isso é que não. E podemos fazer desenhos com os lápis de cor novos que recebi nos anos e enfeitamos o pinheiro com eles. – disse a menina.

      Os pais estavam admirados com a reação dos filhos, mas muito felizes, pois perceberam como os estavam a educar bem.

      Na noite de Natal, depois da ceia, a família jogou vários jogos e viram um pouco de televisão, até que os pais mandaram os filhos para a cama. Na manhã seguinte, logo que se levantaram, as crianças começaram a cantar “Feliz Natal, feliz Natal” e, a cantarolar, dirigiram – se para a sala, para tomar o pequeno – almoço. Os pais já lá estavam e disseram – lhes:

      - Vejam a surpresa!

      Eles olharam e viram, junto ao pinheiro, dois embrulhos. Correram a desembrulhá – -los e ficaram muito contentes com os presentes que receberam: um carro telecomandado e uma barbie. Felizes, começaram de imediato a brincar. O pai ensinou o filho a dirigir o carro e a mãe divertiu – se a brincar com a filha.

     Ao almoço a família deliciou – se com o prato tradicional português, a roupa velha e, durante a tarde, conversaram. O tema da conversa foi o teste que os pais lhes tinham preparado. As crianças responderam que, apesar de estarem satisfeitos com os presentes, os pais não precisavam de se preocupar com isso, porque o mais importante era estarem juntos a festejar o Natal. Depois de a família ter carregado energias, recomeçou a brincadeira.

      Os pais estavam contentes ao ver a alegria no rosto das crianças e pensaram como eram felizes. Por isso, quando mandaram os filhos para a cama e eles insistiram para ver um pouco de televisão, os pais concordaram, pois aquela era, de facto, uma noite especial.





João Costa Paz



(João Silva, 6º1 Escola EB 1,2,3 de Gondifelos- 2ºPrémio- Escalão A)


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A FELICIDADE DE CAROLINA



     Carolina tinha oito anos. Ficou órfã com três anos e, como nenhum familiar tinha a possibilidade de ficar com ela, teve de ir para um orfanato. No orfanato ela era muito infeliz. Apesar de ter muitos amigos, faltava-lhe o carinho e o amor de uma mãe e de um pai.

Aproximava – se o Natal e todas as crianças escreviam cartas ao Pai Natal com os seus pedidos. Então Carolina pensou que talvez o Pai Natal a pudesse ajudar a realizar o seu maior desejo e fez o seguinte pedido:

   “ - Pai Natal, este ano, em vez de presentes, eu quero ter uma família que goste muito de mim! Espero que realizes o meu desejo. Obrigada, Carolina”

   E Carolina ficou a aguardar, cheia de esperança, a chegada do Natal. Mas, quando na véspera de Natal viu que todos os seus amigos recebiam os presentes que pediram, menos ela, resolveu insistir:

            - Pai Natal, porque não atendeste o meu pedido? – perguntou Carolina.

            - Eu ainda não consegui encontrar o teu presente. - informou o Pai Natal.

            - Mas conseguiste o presente para todas as outras crianças… - continuou a menina.

            - Os pedidos dos teus amigos são mais fáceis de concretizar. Prometo que logo que consiga, eu realizo o teu pedido. – tranquilizou – a o Pai Natal.

            Carolina contou todos os minutos que passavam, pois estava ansiosa que chegasse o dia de Natal. Mal conseguiu dormir e quase não brincou com os seus amigos. Era quase manhã e a menina levantou – se à espera de uma surpresa. Nada… Não conseguiu aguentar mais e foi falar novamente com o Pai Natal.

            - Pai Natal, desculpa a minha insistência, mas já conseguiste concretizar o meu pedido? – perguntou Carolina muito ansiosa.

            Enquanto a Carolina questionava o Pai Natal, a secretária do diretor do orfanato estava a conversar com um casal que, em princípio, iria adotar Carolina. O Pai Natal estava a fazer suspense, pois não tinha a certeza se seriam estes os seus novos pais. Quando teve a certeza disse-lhe:

            - Carolina, vem comigo. – E dirigiram – se para o salão. - Aqueles são os teus novos pais!

            Carolina, muito feliz, correu para os braços dos seus novos pais. Mas primeiro agradeceu ao Pai Natal, por ter realizado o seu desejo. Antes de se ir embora com a sua nova família, despediu – se dos seus amigos e do diretor. Foi então que viu como ele se parecia com o Pai Natal!

            Já na sua nova casa viu que esta era enorme e muito bonita. O seu quarto era um paraíso, nunca tinha tido um quarto tão bonito. Contudo, reparou que ainda não tinham enfeitado a casa para o Natal!

            - Estavamos à espera que tu chegasses, para nos ajudares a decorar a casa, Carolina. – disseram os pais, também muito felizes.

Para Carolina aquele foi um Natal muito feliz e teve a certeza de que ter uma família é o melhor presente do mundo.



Ana Santa Marinha





(Ana Sofia Moreira, 6º1 -Escola EB 1,2,3 de Gondifelos-3º Prémio – Escalão A)
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O Natal de Joana

- Joana, Joana! Anda, filha, temos de ir buscar o pinheiro para o Natal. A tia viu, na mata das Moitas, uns muitos jeitosos de onde podemos cortar uma rama para fazer uma bela árvore de Natal.

Joana ficou empolgada, ela adorava o Natal, era a altura do ano em que a fantasia se misturava com os sons, cheiros e cores da Terra.

- Olha Joana, o que achas deste aqui?

- A mim parece-me bem, tia, não é muito grande nem muito pequeno e tem uma rama muito vistosa; vamos levá-lo!

- Também acho! – concordou a tia.

- Será que a Margarida já fez o presépio dela? Ela faz sempre um presépio tão bonito tia.

- Não sei, querida, mas logo saberás, podes pedir à Margarida para te ajudar a decorar o teu pinheiro de Natal!

Joana estava feliz e ansiosa, ela adorava o presépio da sua amiga, tinha animais, pastores, lavadeiras, reis Magos, padeiros, crianças a brincar, um sapateiro e até tinha um lago, fazia-lhe lembrar uma aldeia em miniatura. Mas o que Joana mais gostava era da figura do menino Jesus, se calhar por ser um menino com quem Joana sonhava brincar.

- Margarida olha! Já tenho o meu pinheiro de Natal, já só falta decorá-lo. E tu, já fizeste o teu presépio?

- Ainda não acabei, queres vir ajudar-me?

- Claro que sim! Vamos já para não perdermos tempo! O teu presépio é mesmo giro, com tantas luzes e todas estas figurinhas.

- Sabes, trouxe tudo de Angola quando eu e os meus pais viemos embora.

- De Angola? Onde é que fica Angola?

- Oh, muito longe, é um país muito quente com grandes florestas e muitos animais.

- Então Angola deve ser um país muito bonito, porque vieste embora?

- Por causa da guerra.

- Da guerra? E o que é a guerra?

- A guerra é uma coisa muito má, destrói as pessoas e leva-as a fazer coisas muito feias umas às outras, por isso eu e os meus pais viemos embora.

Joana ficou assustada, Margarida era apenas uma criança como ela, já tinha visto o lado mais triste da vida, as crianças não deviam sofrer nem chorar. Joana era uma menina muito feliz, apesar de não ter um presépio como o da sua amiga e a sua árvore de Natal ser coberta apenas de algodão, o que lhe fazia lembrar a neve que todos os Invernos caía, branca e fofa e cobria a sua aldeia. Margarida sabia que Joana não tinha um presépio, por isso, decidiu oferecer-lhe uma das suas estrelas preferidas, para que Joana a colocasse no cimo do seu pinheiro de Natal.

- Fico muito contente - disse Joana - É a minha prenda de Natal, uma estrela para o meu pinheiro, vai ficar lindo, com muita neve e lá no cimo, bem alto, fica esta estrela a brilhar, vai ser o pinheiro de Natal mais fantástico que alguma vez tive.

            - O teu presépio tem neve? E o que é a neve?

- Tu não sabes o que é a neve Margarida? Nunca viste nevar?

Joana estava impressionada com o facto da amiga não saber o que era a neve, mas em Angola não nevava, era um país com muito sol. Margarida estava surpresa com a admiração da amiga, será que era assim tão estranho não saber o que era a neve?

- A neve - disse-lhe Joana - é simplesmente bela, cai silenciosa na nossa mão, no jardim da escola e, por vezes, cai durante tanto tempo que parece que cresce da terra, é quando mais gosto de ir à escola, de fazer grandes bolas com os meus amigos e depois, atiramo-las uns aos outros.

- Será que vai nevar este inverno? – perguntou Margarida. – Eu gostava tanto que nevasse para fazermos bolas juntas e bonecos de neve.

- E vai nevar, neva sempre no inverno – disse Joana – mas agora gostava muito de te ajudar a terminar o teu presépio.

- Claro que sim e depois vamos fazer o teu pinheiro de Natal - acrescentou Margarida.

E assim, saboreando o prazer de estarem juntas, as duas amigas concluíram as suas obras natalícias, na esperança de que os flocos de neve as viessem visitar e que, em Angola, apesar de não nevar, as crianças também pudessem estar juntas.



Inesita

(Inês Rodrigues – Escola D.Pedro IV – Queluz - Menção Honrosa - Escalão A)
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Um Conto De Natal
Flor era uma rapariga simpática e muito aventureira. Ela adorava correr e saltar e vaguear pelos campos. Enquanto passeava, levava sempre um caderninho e um lápis onde apontava tudo aquilo que lhe vinha à mente e achava interessante. Às vezes chegava a casa, abria o caderno e este estava repleto de frases sem sentido; outras vezes tinha escrito poemas ou mesmo histórias de encantar. Era muito imaginativa. Sabendo isto, a sua professora pediu-lhe que escrevesse um conto de Natal durante as férias.
Tal como em todas as manhãs, encheu o cantil, colocou bolachas num saquinho, agarrou no caderno e um lápis, vestiu um casaco quente e saiu pela janela do quarto. Colocou o cachecol, e aí estava ela pronta para mais uma aventura.
Começou a correr pelo trilho da floresta, até desaparecer no meio das árvores. O dia de hoje destinava-se à escrita do conto. Nos últimos dias não tinha estado muito inspirada, e dentro de pouco começava a escola.
Correu até ao riacho e sentou-se à sua beira, petiscando algumas bolachas. Começou a observar o seu reflexo nas águas calmas. Depois sorriu, lembrando-se do pobre Narciso, que morreu à fome, por passar dias a fio a contemplar-se. Levantou-se de repente, não lhe fosse acontecer o mesmo, e correu mais um pouco. O sol já lá ia em cima e até agora, ainda nenhuma ideia digna de escrita.
Determinada, encostou-se a uma árvore e agarrou no lápis e caderno e começou a pensar. Ora bem... pensava de olhos fechados a história vai ser sobre... abriu os olhos e o que viu foi um rapaz?!, pensou um pouco hesitante e incrédula ao mesmo tempo, pois nunca tinha ali visto ninguém e agora, do nada, aparecera-lhe um rapaz à frente. Tinha aproximadamente a sua idade, talvez um ano mais velho. E era muito bonito oh, se é!, pensava para consigo. Voltou a fechar os olhos e a abri-los para ter a certeza de que não era a sua imaginação. Mas ele permaneceu ali.
- O meu nome é Afonso – disse sorrindo e estendendo-lhe a mão.
Flor, incrédula, apertou-lha.
- Tenho uma coisa para te mostrar – disse o rapaz. Agarrando-lhe a mão com mais força ainda, desatou a correr. Ela acompanhou o passo, claro, caso contrário cairia no meio do chão. Correram para trás, passaram pelo riacho, e depois pelo trilho.
- Já chegámos – disse o rapaz, sorrindo-lhe.
No que é que eu estava a pensar?! Falar com um estranho?! Deixar que ele me leve a algum lado?! Eu devia era ir-me embora... espera aí!
- Mas esta é a minha casa! – disse Flor, sentindo-se cada vez mais confusa.
- Eu sei. Era minha, mas agora é tua – disse o rapaz – quero mostrar-te o interior.
Pegou-lhe desta vez pelo braço e arrastou-a até ao hall antes que ela pudesse mesmo pestanejar. A mobília mudara, tal como a decoração. Tudo era muito antigo. Aquela quase não parecia a sua casa. Caminharam até à sala.
- Estes são os meus pais – disse Afonso apontando para a mãe e o pai, sentados no sofá, lendo revistas e jornais e bebericando chá. Nenhum dos dois olhou sequer ao som da voz de Afonso. Era como se ele não ali estivesse... Flor estava a achar tudo isto muito estranho.
Dirigiram-se ao seu quarto, isto é, ao quarto de Afonso. Ao entrar, Flor ficou boquiaberta. Estava muito diferente do seu quarto. Os móveis eram muito antigos, do século passado, pensou Flor. Sentaram-se num pequeno sofá e Afonso começou a falar.
- Eu sei que tudo isto deve ser estranho para ti. Mas... – ele estava um pouco hesitante. Flor começava já a ficar nervosa com o que se seguia – mas eu não te traria aqui se não soubesse que compreenderias e não te irias embora.
- E onde é que eu estou, exactamente? – perguntou Flor, engolindo em seco.
- Estás no passado, é claro. Eu vivo nesta casa agora. Tu só aqui viverás daqui a cem anos. Eu trouxe-te porque me sinto muito só. Precisava de alguém que quisesse passar o Natal comigo. Os meus pais nem notam que existo... prometo que amanhã estarás de novo na tua vida.
Flor tentou digerir toda aquela história em segundos, teve pena do rapaz, e ficou a fazer-lhe companhia. Passaram a noite a fazer e comer doces na cozinha. Depois procuravam coisas pela casa e ofereciam-nas um ao outro, rindo-se muito das escolhas. Durante todo esse tempo, os seus pais ficaram imóveis na sala.
Passaram uma noite inesquecível. Brincaram, jogaram, riram, conversaram, fizeram de tudo. Tornaram-se amigos e até desabafaram um pouco um com o outro. Flor até lhe contou que as suas flores favoritas eram narcisos... ele, por sua vez, adorava a misticidade da lua. Afonso estava muito mais contente por ter passado o Natal acompanhado e, para dizer a verdade, Flor também estava feliz por ter arranjado um novo amigo que a compreendia tão bem...
Flor abriu os olhos. Estava feito. Já era de noite. Estava sentada à beira do rio. Vasculhou rapidamente o caderno e a história estava lá. Tudo o que se tinha passado com Afonso estava lá escrito. Depois levantou-se e, quando já se ia embora, reparou que o rio estava repleto de narcisos nas suas margens.
Flor sorriu ao luar e dirigiu-se a casa, mais feliz do que nunca.
Sasha Belov
(Inês Belo, 12º ano- Escola Secundária João de Barros - 3º Prémio- Escalão B)
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Conto de Natal

   O Ricardo era agora um homem adulto, saudável e bem-disposto. Casado havia pouco tempo, uma semana antes do Natal, insistira com a sua jovem esposa para que passassem a lua-de-mel no Brasil. Diga-se em abono da verdade que não precisou de insistir muito, uma vez que Gabriela não era dada ao clima frio do norte de Portugal, local em que vivera desde sempre. Talvez seja sob o resguardo desse facto que fingiu não se lembrar de perguntar ao marido por que motivo desejava ele ir para tão longe. A resposta poderia ser muito simples, mas assim não haveria uma história para contar.
   Portugal tem fama de ser um país quente; caramba, há estrangeiros que perguntam aos portugueses se eles têm alguma coisa que se pareça com um Inverno! Pois esta pergunta indignaria Gabriela, de mãos azuis mesmo quando cobertas pelas luvas, parecida com o Corcunda de Notre Dame de tantos agasalhos que usa. Ricardo, caloroso e calorento ao mesmo tempo, suavizava a situação com um comentário amoroso ou trocista para com a ignorância de terceiros. Na verdade, Ricardo adorava o frio, o vento cortante que o desafiava a um combate, a neve de veludo branco, os poderosos pinheiros, que mantinham a sua folhagem, sorrindo triunfantemente à geada. Tomava banhos de água fria, um pequeno-almoço volumoso e quente e zarpava para a rua imediatamente.
   Mas Ricardo queria passar o Natal no Brasil. Passara sempre o Natal em Bragança, com a sua avó, a única família que jamais conhecera. No Natal era certo e sabido que Ricardo acordaria já com o cheiro de massa a fritar e de canela misturada com açúcar; que a casa estaria já impecavelmente limpa para receber o pequeno mas animado grupo de amigos que a avó convidava todos os anos; que as decorações não seriam muitas, visto que a avó fora sempre muito contida nos gastos; que as decorações não seriam necessárias, visto que a lareira e a companhia faziam a atmosfera; que depois do almoço de Natal, a avó estaria, interminavelmente, a tricotar agasalhos em lã vermelha, sempre lã vermelha; que ele próprio usaria um gorro de lã vermelha e iria para a rua com os filhos dos convidados fazer um boneco de neve; que enfeitariam o boneco com um cachecol de lã vermelha, botões velhos para os olhos e galhos para os braços; que quando estivessem cansados, ele e todas as outras crianças poderiam voltar para a casa e arranjar maneira de pôr todos os adultos a rir. Sim, o Natal era uma época esplêndida na casa da sua avó.
   Mas Ricardo queria passar o Natal no Brasil. O motivo é apenas este: a sua avó morrera a meio de Setembro. Ela chegara a conhecer Gabriela e a afeiçoar-se a ela; chegara a ajudar Ricardo a escolher o anel de noivado que queria oferecer a Gabriela; chegara a ser convidada para o casamento; chegara a oferecer a Gabriela o seu próprio vestido de noiva, lindíssimo apesar dos seus anos. Sempre sã que nem um pêro, mas levada por um ataque cardíaco sem mais nem menos. O choque atingira Ricardo como uma bola de neve a rebentar mesmo no seu nariz. Não havia aquela poesia que surge nos livros ou nos filmes em que a Morte coincide com um dia importante, como um feriado nacional, ou o dia do aniversário do falecido. Não, a única coisa diferente era que a pessoa que iluminara o caminho do jovem havia desaparecido e não havia maneira de a contactar.
   Ricardo queria passar o Natal em Bragança. Não o faria. Já estivera na casa da avó, que lhe deixara praticamente tudo o que tinha, e sentiu-se completamente incapaz de celebrar o Natal ali, naquela casa que era o seu templo, de tentar sequer reproduzir a magia que só ela conseguia trazer para as paredes nuas daquela casa de pedra.
   Ricardo decidira passar o Natal no Brasil, num ambiente natalício tão diferente daquele que ele conhecia quanto possível. Mostraria sempre uma cara alegre, embora sentisse tristeza.

   Ricardo teria evitado passar o Natal na casa da sua avó para sempre se Gabriela não tivesse arregaçado as mangas e recriado o Natal no ano seguinte. Gabriela não pretendia aprender a tricotar, mas tudo o resto ela fez acontecer – mas não sem exigir que Ricardo desse uma ajuda, claro. Doces de Natal, a casa limpa, o grupo de velhos amigos e de novos amigos, outras crianças a brincar na neve. Ricardo conseguiu assim, com a sua ajuda, seguir em frente; descobrir que a sua esposa era especial, mas sem nunca esquecer quão especial fora a sua avó.

Olívia de Sousa
(Ana Sofia Oliveira, 1º Prémio - Escalão C)
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24 de Dezembro de 2011
Neste preciso momento penso que deve estar a sentir o mesmo que as personagens de inúmeros filmes e histórias onde, a certo ponto, lhes aparece uma garrafa de vidro com um papel enrolado lá dentro. E aqui permita-me, desde já, apresentar as minhas desculpas se o desiludi quanto ao facto desta ser uma garrafa de coca-cola e, por sinal, de plástico. Era o que tinha à mão, na altura. Espero que não lhe tenha já estragado o romantismo da situação. Pense antes que, caso isto tenha ido parar às suas mãos no dia de Natal enquanto dava o seu passeio à beira-mar para digerir os exageros culinários típicos desta altura do ano, é o sujeito que recebeu o presente mais insólito deste ano. Feliz Natal!
E queira-me desculpar também o facto de, com muita pena minha, este pergaminho não conter nenhuma mensagem secreta nem nenhuma verdade universal sobre o sentido da existência ou outro conceito do género que, por sua vez, quanto a mim, tem tanto sentido de existir como o sentido que algumas pessoas dão a essa discussão. Ou seja, nenhuma. Não é que o sentido da vida seja o mau da fita, mas é que quando as pessoas falam sobre isso mistificam tanto que borram a pintura toda.
Elucido também que esta missiva (nem sei se a devo nomear de missiva uma vez que se destina a si, não fazendo eu a menor a ideia quem é si) não é, de todo, um pedido de ajuda de um náufrago que se encontra por aí à deriva, ao sabor das vagas. Na verdade, trata-se exactamente do contrário. Há uns anos atrás deparei-me com um fenómeno estranho. Um fenómeno mental, podemos chamar-lhe. Era dia de Natal e, numa das saídas habituais para passear a minha cadela, fui assaltado pela sensação de que a rua e as pessoas estavam mais distantes do que o habitual. Não no sentido de estarem mensuravelmente mais longe de mim; tinha mais que ver com o facto de eu ter a sensação de estar sempre numa posição paralela à delas. O suficiente para ter a ilusão de que estávamos no mesmo sítio mas sem conseguir sentir que partilhávamos a mesma realidade. A princípio, até nem desgostei da ideia. Sempre fui introvertido, fosse pela minha timidez, fosse por achar que sempre que expressava a minha opinião fazia-o numa língua exótica qualquer, incompreensível para os meus interlocutores. Acomodei-me a isso, julgando-me envolto numa nuvem protectora da inutilidade vinda do exterior. O problema maior surgiu quando comecei a ter consciência de que não captava bem a informação que alguém me queria transmitir quando falava comigo. Atribuí o fenómeno a várias causas, distracção, cansaço e até surdez. Sugeriram-me, no trabalho, pôr baixa e consultar um psicoterapeuta. A verdade é que a situação foi piorando até eu não perceber patavina do que me diziam. Agia apenas por vontade própria e auto-recriação, não por egoísmo mas por não ter mais nenhum critério para assentar a minha conduta. Ainda assim, não posso dizer que me sentisse propriamente infeliz uma vez que, como já tinha dito, sempre fui uma pessoa solitária que gosta de o ser. Comecei a ver os outros como parte de uma realidade que, a pouco e pouco, se descolava da minha. O único espaço público que frequentava eram as ruas que me levavam ao meu local de trabalho e pouco mais. Isto durou alguns meses, até que se tornou claro para mim mesmo não queria estar inserido em contextos sociais. Note-se que o meu problema não foi, claro, ter deixado de perceber português, foi antes ter deixado de compreender o sentido que as pessoas lhe davam ao imprimir-lhe as suas ideias.
O episódio mais constrangedor sucedeu numa noite (ainda no início de convivência com a minha nova condição psicológica, chamemos-lhe assim) em que levei a minha namorada da altura a jantar fora, poucos dias depois do dia de Natal. Tudo corria esplendidamente, o restaurante tinha poucas pessoas e ela estava lindíssima. A dada altura, a minha companheira começou a falar sobre o jantar de Natal da empresa e sobre o facto específico da sua arqui-inimiga (nem sei como lhe chamar, suponho que nem ela saiba) ter levado um vestido igual ao dela. À medida que avançava na conversa, vi-a a ficar cada vez mais enfurecida e com os olhos raiados de sangue. Julguei estar a alucinar e, tentando apurar a verdade, disse-lhe “Desculpa, mas não percebi bem o queres dizer com isso.” Indignada, voltou a explicar-me pormenorizadamente o que tinha acontecido. “Querida,” – disse eu – “desculpa-me, mas não estou a conseguir perceber bem a razão pela qual estás assim”. Ela atirou o guardanapo para cima da mesa e disse que era óbvio que eu não lhe estava a dar atenção. E até hoje, permaneço na ignorância. Mas Deus, como ela ficou feia quando se enfureceu!
Foi então que comecei a equacionar a hipótese de ser inapto para lidar com um certo tipo de pessoas. O tipo que se pode dizer que corresponde à maioria. Então, pensei em mudar de casa para um local que permitisse manter-me fisicamente e mentalmente apartado da realidade. A realidade da maioria, está a seguir-me? Foi então que comprei um pequeno barco a um pescador reformado e, a 25 de Dezembro do ano passado, decidi que ia viver no mar, de onde a costa me pareceria apenas um quadro de formas pouco definidas que tornava apenas uma sombra nas manhã de nevoeiro. A vida tomou o gosto da cadência da ondulação e percebi que aquela era a minha a minha oportunidade de me reencontrar comigo próprio e com algo que, apesar de ainda não saber muito bem o que era, me faz saber que afinal tenho o meu lugar no mundo. Peço desculpa se me alonguei demasiado mas é que não quero mesmo deixar a realidade equivocada quanto à minha existência e que me tomem por um náufrago. Isto se derem pela minha falta, claro.
Raimundo Vagabundo
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UMA LARANJA DE OIRO…


Há muitos anos atrás, numa pequena aldeia localizada nas encostas da Serra da Estrela, que se chamava(e ainda hoje se chama) Sazes da Beira, vivia uma família de quatro irmãos e uma irmã, numa pequena casa de xisto. Os pais trabalhavam no campo e era dele que extraíam tudo o que necessitavam para sobreviver, mas, embora a terra lhes desse muitos alimentos, não conseguiam ter uma laranjeira…
O Natal estava a chegar e as crianças, porque são crianças, resolveram escrever ao Pai Natal para pedir uma prendinha. Um par de meias, um cachecol feito pela avó, umas luvas grossas para tapar o frio da serra, um gorro, ou mesmo nada. E, dessa forma, já se sentiam as mais felizes do mundo!
Mas o Tonito, o mais novo dos irmãos, tinha um desejo muito especial: queria ter uma laranja. Nunca tinha comido uma laranja e gostava de saber como era o seu sabor. O paladar é uma “vista estranha”. Evoca sensações diferentes e provoca desejos intensos no subconsciente de cada um de nós. E foi isso mesmo que aquela criança de seis anos de idade desejou tão intensamente para esse Natal que se tornou no mais importante da sua vida… só porque conseguiu ter a laranja que tanto queria.
Ora, deve o estimado leitor perguntar-se como é que apareceu a laranja no sapatinho do Tonito? A tia Cacilda, irmã da mãe de António, trabalhava nas limpezas de uma casa abastada, cuja proprietária, a dona Cremilde, era rica e vivia desafogadamente. O contraste entre o que acontecia naquela casa e o que se passava lá fora era enorme. O Natal era repleto de coisas doces, muitas prendas e até havia um pinheiro tão grande que qualquer criança desejaria ter, ainda mais quando à sua volta estavam dezenas de prendas para os meninos da dona Cremilde. E o Tonito, a Rosa e o Luís também eram crianças,.... mas para elas a vida era um pouco mais dura.
Já na véspera do Natal, Cacilda, que se encontrava a limpar a sala, viu uma cesta de laranjas reluzentes em cima da mesa e perguntou à dona da casa se não tinha uma ou duas laranjas que lhe pudesse dar…é que no quintal da sua casa não havia laranjeiras e aquela “bolinha” laranja, certamente que faria uma pessoa que ela conhecia a mais feliz do mundo. Dona Cremilde admirou-se com aquele comentário pelo que, naquele instante, lhe ofereceu todas as laranjas que estavam no cesto. Até porque havia tantas laranjeiras no seu quintal  que em qualquer altura poderia apanhar mais. A tia Cacilda ficou radiante com a oferta, cheirou aquelas frutas e gritou de alegria. Em seguida, desejou um Feliz -Natal a todos e dirigiu-se para sua casa com um saco cheio de laranjas.
Quando chegou, viu que Tonito estava só, a chorar. Perguntou-lhe o que se passava com ele. Este respondeu-lhe que tinha pedido ao Pai Natal uma laranja, mas que, se calhar, ele só lhe ia dar mais um par de meias e essas ele tinha algumas. A tia disse-lhe para não estar assim, que o Pai Natal tinha certamente ouvido o seu pedido e que, teria a sua “bolinha” cheirosa. No entanto, o menino teria de se provar merecedor de tal prenda. Primeiro, teria de comer tudo (até o bacalhau e as couves que ele detestava) e depois dormir um soninho descansado. E assim fez o António.
No dia seguinte, dia de Natal, Tonito levantou-se de mansinho para não acordar os irmãos, dirigiu-se à pequena sala da casa e qual não foi o seu espanto quando viu o seu sapatinho meio gasto repleto de laranjas. Ele só queria uma, mas eram tantas as bolinhas que deu gritos de alegria. É evidente que os pais, irmãos e tia acordaram logo, e conseguiram ver a satisfação daquele rosto pequenino que apenas dizia:
- Eu só pedi uma laranja de oiro…e tenho tantas que estou muito rico! Afinal, o Pai Natal existe mesmo!
E dessa forma simples e bela se fez a delícia de uma criança, igual a tantas outras, mas que queria como prenda de Natal apenas uma laranja!



(História inspirada em personagens e factos reais)



                                                         
                                                                                 Estrelinha de Natal
                                                          (Paula Duarte – 3º Prémio – Escalão C)




 


















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